Filme: Matrix Resurrections
Direção: Lana Wachowski
Crítica Noobz: Ataliba (@AtalibaNoobz)
No final dos anos 90, início dos anos 2000, fomos presenteados com uma das franquias cinematográficas mais disruptivas e emblemáticas que foi a trilogia Matrix. Criação das irmãs Wachowskis os longas ainda ganharam complementos ao seu universo através de animações e jogos que fazem parte da cronologia oficial.
Passados 18 anos chega aos cinemas um novo filme da franquia, The Matrix Resurrections, que traz de volta os protagonistas Keanu Reeves e Carrie-Anne Moss. Na direção, porém, uma das irmãs optou por não seguir no projeto e Lana Wachowski assumiu sozinha a responsabilidade de dar continuidade a uma das mais marcantes franquias do cinema.
Uma nova abordagem
Lembro-me que quando o primeiro Matrix foi lançado, haviam diversas matérias, reportagens e discussões causadas sobre o filme tanto pelo seu universo quanto por tudo o que ele nos fazia refletir sobre a sociedade em que vivemos. O bacana é que ele entrega muita coisa, mas deixa muitas lacunas para que você complete com sua experiência e visão e isso faz com que possamos ter pontos de vistas diferentes, mas corretos sobre as reflexões causadas.
A trilogia oficial tinha uma raiz muito forte dentro da cultura e filosofias orientais e apesar de trazer uma enxurrada de críticas sociais, ao meu ver, lhe dava uma visão mais intimista sobre o seu papel social e como você se encaixa nessa grande máquina que é o sistema. Grande parte das ações e reflexões era sobre como você se sente nesse universo e como você pode se ‘libertar da Matrix’.
Muitos anos se passaram, o mundo mudou e Matrix 4 traz uma abordagem completamente diferente e mais explícita aos modelos impostos e todos os paradigmas criados para que possamos nos espelhar e nos orientar sobre o que é legal, bonito ou certo. O longa começa com Keanu Reeves como um game designer mundialmente conhecido pela trilogia de jogos Matrix e aqui entra uma série de discussão de conceitos, paródias e metalinguagem dentro do filme e com a realidade sobre essa sede hollywoodiana de impor padrões e doutrinar os espectadores a esperar o modelo sempre pré-fabricado do que eles querem entregar. Em tempos de filmes vazios e resgates nostálgicos e desnecessários para caça-níquel, Matrix 4 bota o dedo na ferida e escancara o quão moldado estamos para consumir sempre as mesmas coisas e nos revoltarmos quando essa regra é quebrada.
O desenvolvimento dessa temática passeia pelo humor e a paródia, uma vez que se observar Matrix Resurrections nada mais é do que um produto ao qual ele se propõe a criticar. Dessa forma, para que esse paradoxo não se torne uma hipocrisia ele precisa se desconstruir e para isso entregar algo completamente diferente do que os fãs esperam. Por conta disso, você lerá críticas e verá comentários completamente opostos sobre a nova aventura de Neo e Trinity. De inovador a desnecessário; Reflexivo a Caça-níquel. Já vou me adiantar, não vivo em um mundo preto e branco, costumo enxergar tonalidades de cinza entre ambos e achei o filme apenas ok, mas devo admitir que essa quebra e visões tão conflitantes torna o objetivo de Lana Wachowski completo. Sim, ela conseguiu o que queria!
Não apenas sobre os padrões já estabelecidos, mas o filme também traz uma discussão sobre um novo mundo e a ressignificação que as coisas precisam ter de tempos em tempos e o papel de Trinity nessa narrativa é de extrema importância, pois ela é o expoente de uma atualização de olhares e padrões do mundo atual.
As críticas do filme a indústria são tão diretas que por vezes o longa parece estar quebrando a quarta parece para conversar diretamente com o público e os executivos sobre o quão precária está a situação artística e criativa da indústria.
O novo Matrix é um manifesto de Lana Wachowski a sociedade, grandes corporações e a própria indústria do audiovisual, através do próprio audiovisual. O que torna isso mais genial e impactante é que foi feito dentro de um blockbuster, fugindo dos padrões que os mesmo devem ter. O longa, aliás, critica sua própria existência.
Cinema
Existe uma mensagem, um manifesto, uma crítica e uma desconstrução, tudo bem claro. E chegou a hora de aplicar em um filme e é ai que, ao meu ver, começam os deslizes. Não basta você ter uma grande ideia ou uma grande mensagem, você precisa saber como passar a mesma. Tão importante quanto o que você fala é como você fala e Matrix Resurrections peca em sua construção. Isso, é claro, do meu ponto de vista, porque o que faz de Matrix 4, um verdadeiro Matrix é que boa parte do que me incomodou, cinematograficamente falando, foi consciente. Mas toda essa discussão no todo ao final do filme, me pareceu necessária, mas sua aplicação não me pareceu bem feita. O mensagem se sobrepôs a narrativa e tornou o longa cansativo e desequilibrado, pois se você esperava ação, ficou cansado o quão arrastado esse desenvolvimento acontece e se você comprou o discurso acaba ficando desiludido com a ação vazia e sem personalidade, que parece estar lá por uma obrigação já que é Matrix.
Não é o porque você tem uma mensagem maior que deve esquecer a cinematografia. Um belo exemplo de crítica e desconstrução e ainda assim um filme maravilhoso e bem construído é A Pequena Miss Sunshine.
O filme se propõe a trazer uma nostalgia com pequenos recortes dos filmes originais, mas soando como uma crítica, como se estivesse entregando para os fãs a dose de nostalgia necessária dentro dos padrões exigidos de hoje, para depois quebra-lo. Por vezes, inclusive, o excesso de referências aos outros filmes e obras paralelas como as animações, parecem excluir os novos espectadores que não tem um conhecimento tão profundo sobre a trilogia e seus derivados, isso pode fazer com que todo o discurso mostrado fique chato.
A ação é um capítulo a parte. Tudo muito genérico, algumas até pouco justificadas e as cenas de luta, em especial, sem vida. A trilogia original teve na ação e nas cenas de luta alguns de seus pontos mais marcantes e revolucionários, mas aqui, não vemos nada disso. As cenas de luta são cansativas e coreografadas de uma maneira muito qualquer coisa, não se comparando a nenhum dos três filmes originais. Não é porque eu quero desconstruir que eu preciso fazer mal feito. Ah, mas o discurso é justamente sobre isso, não seguir o padrão das grandes lutas, por exemplo. Se quer mesmo chocar, então não faça! Já imaginou todo esse discurso e ao final nenhuma cena de luta? Frustrante, mas genial, dentro da proposta do projeto.
Falando em efeitos especiais, o longa nos apresenta um efeito que se denomina como o novo “bullet time”. Para quem não sabe, nos filmes originais, esse efeito foi tido como revolucionário e foi usado em diversos outros filmes que se seguiram, eles quebraram as expectativas e trouxeram algo completamente novo para o cinema. Em Matrix Resurrections eles apresentam um novo efeito tido como o novo ‘bullet time’, mas nada impressionante em uma cena longa e cansativa, que poderia ser bem mais concisa. Confesso que posso ter caído em um bait e isso também ser uma crítica, mas ainda assim não gostei de sua aplicação pouco criativa e mais longa do que poderia ser.
A atuação de Keanu Reeves também não me pareceu muito inspirada, diferente de seus colegas de elenco. Carrie-Anne Moss, por sua vez, está muito bem.
Um ponto que vale a pena ser ressaltado é que o filme é uma continuação direta da trilogia original, validando tudo o que foi construído e assim derrubando rumores de que os filmes originais poderiam ser apenas uma ilusão ou algo do gênero. Revisitar o mundo real deste universo e ver o retorno dos protagonistas bem como de outros personagens e como Neo foi, de fato, tão lendário e impactante na luta entre homens e máquinas e como isso tudo mudou o mundo, foi muito positivo.
Nem lá, nem cá
Por conta de seu discurso eu consigo entender quem amou Matrix e abraçou a ideia de Lana Wachowski. Também consigo entender quem se decepcionou, afinal a trilogia original entrega um discurso e um produto que se conversam e isso não acontece em Matrix Resurrections de maneira tão perfeitamente simbiôntica quanto no passado. Momentos longos, cansativos e arrastados, além de cenas de luta e ação genéricas, sem personalidade e por vezes até meio preguiçosas. A realidade se sobrepôs a ficção e fez de Matrix Resurrections, um verdadeiro Matrix, mas o mais fraco da franquia.
Trailer
Nota: 6.0
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